Sunday, March 01, 2009


Eu vivo num país onde se come mal, mas onde, amiúde, se proclama o contrário. Dizemos com infinita sobranceria que lá fora se come mal a começar pela nossa vizinha Espanha. Apesar de todas as evidências do contrário, não há português nenhum que não clame alto e bom som a qualidade da nossa gastronomia. Quando são pedidas evidências as coisas começam a complicar-se. O único contributo inovador para a culinária mundial portuguesa no século XX é, pasme-se, a Francesinha, nada mais próximo do fast food do que de uma verdadeira tradição gourmet. A arte culinária de um país cujo prato tradicional da consoada, a festa mais importante do ano, quando todas as famílias se reúnem à mesa é o bacalhau cozido com batatas ou, na versão mais completa bacalhau com todos. Sendo este todos um eufemismo para referir a abundância dos acompanhamentos. A saber: batatas, couves, cenoura e um ovo cozido por comensal. Tudo cozido a preceito. Suficiente para levar ao desespero qualquer cozinheiro medíocre. Até a mais remota aventesma consegue dar conta do recado. Basta para isso que o fogo já tenha sido inventado. Depois desta demonstração de excelência gastronómica só apetece cortar os pulsos. Como se isto não bastasse, no verão, quando o calor convida à festa, os portugueses juntam-se e, para celebrar. Mostram os seus dotes culinários. Como? Assam sardinhas, cozem batatas e fazem salada de tomates e pimentos. Et voilà. A suprema demonstração da sua sofisticada cultura gastronómica. Só mais uma palavra para falarmos dos molhos. Não, não me refiro a coisas triviais que levam horas a preparar. Nada disso. O triunfo do minimalismo levado ao seu expoente máximo. Azeite e vinagre. Não é bom gosto é desgosto. O grau zero da cultura gastronómica só superado pela antropofagia pura e simples.